OLHAR DE CACIMBO



... porque nenhuma visão é neutra, porque o turvo precisa ser dito, ainda que maldito, antes que se perca em escuridão.










segunda-feira, 2 de maio de 2011

Viagem por Angola V_ de Cuio a LUCIRA.

 (Ver: Viagem por Angola IV) (Viagem por Angola VI)

De Cuio voltamos a Dombe Grande, refizemos nosso caminho até a estrada que vinha de Bahia Farta e aí tomamos a estrada para Namibe.

Andamos toda a tarde. O caminho era de terra, sem placas ne outras indicações.  A paisagem de semideserto, arreia que refletia o sol ardente, plantas baixas e secas, alguns bois bem longe na sombra da única árvore de todo esse mundo que os olhos alcançam.


Aos poucos o caminho foi ficando mais estreito,  mais estreito, e mais e mais ... até chegarmos a uma subida que mais parecia um trilho de animais.

Subimos e no alto imaginamos poder ver algo, uma cidade, uma aldeia, porém só viamos as curvas de um caminhos estreito que serpenteava ao redor das montanhas. Decidimos seguir.
Na seguinte grande subida acontece a mesma coisa. A estrada não parecia ter fim.

Subíamos e descíamos montanhas, contornávamos morros e não víamos nada que não fosse vegetação seca e ruído de alguns pássaros e grilos. Buscamos durante quatro ou cinco horas uma aldeia, uma pessoa, alguém que pudesse nos dizer para onde íamos.
Encontramos uma casa numa baixada, na beira de um rio seco, o telhado era de palha e ao lado havia uma bandeira do MPLA alceada muito alto. Uma menina (de uns 8 a 10 anos) brincava por ali. Lhe perguntamos para onde ia o caminho, ela disse algo incompreensível. Lhe perguntamos pelas pessoas da casa, disse que estavam em... -outra palavra incompreensível- e apontou uma direção.

Seguimos e uns 5 Km adiante encontramos outra casa, estava mais longe da estada que a anterior, pararmos e caminhamos até o lugar. A casa era bastante menor que a anterior e seguia o mesmo estilo, palha como telhado e madeira bruta nas paredes. Embaixo de uma pequena árvore estavam sentada algumas mulheres e um grupo de crianças.

Eram 4 mulheres aparentemente de idade gradual. A senhora mais velha aparentava uns 60 anos e as outras deviam ter 40, 25 e 20 (provavelmente eram mais jovens). As crianças eram muitas, não contei. Todas vestiam saia, nada mais. A mais jovem trazia um bonito colar de sementes no pescoço. A única que falava portugues era a senhora de supostamente 40 anos. Esta senhora dava comida a uma das crianças e do mesmo prato (que estava no chão) se alimentava um gatinho. Ao mesmo tempo que alimentava com uma colher este menino, trazia nos braços um bebê, ao qual amamentava com um dos seios, enquanto do outro sugava o leite um cabritinho.

{não tenho fotos disso porque fui aí sem a câmera e porque não tive coragem de invadir a vida dessas pessoas}

Foi muito amável, afastou o cabritinho e se levantou com o bebe nos braços. Nos disse que de onde vínhamos era a estrada que levavría a LUBANGO, e que para onde segíamos era LUCIRA. Nos disse que ainda faltava muito, mas que seria mais perto que Lubango. Agradecemos, nos despedimos e a ela voltou a sentar-se. Não nos pediu nada, ninguem nos disse mais nada. Continuaram sua tarde calorosa debaixo da pequena sombra e nós o nosso caminho rumo a LUCIRA.

Não sei quanto mais andamos, mas a noite chegou e ainda não havíamos atingido a cidade. A estrada começou a estar melhor e logo começamos a cruzar pessoas que levavam bois na beira da estrada. Quase não podíamos ver e os animais andavam sobre a pista.

Chegamos enfim numa encrusilhada. Nosso caminho se tornava asfalto naquele ponto, e para a direita  tinha uma entrada com uma placa indicando: BEM VINDOS A LUCIRA. Um pouco sem saber o que fazíamos, paramos e logo passou uma grande 4x4 que vinha de Lucira e a estas pessoas pedimos informações.

 Esta foto é da manhã do dia seguinte, porque quando chegamos aí já era noite. O senhor anda é um pastor de bois.

O motorista se chamava ANTÔNIO, um jovem (não tinha mais que 30 anos) que nos explicou onde estávamos, que faltava uns 170 km para Namibe e que se quisséssemo podíamos ir a Lucira, que não nos preocupássemos que o caminho estava todo destruido mas que eram poucos quilometros.

Tambem nos disse que era policial em Benguela e que ficava feliz que estivéssemos conhecendo seu país, nos deu telefone e se ofereceu a judarmos se necessitássemos. { * faço um asterisco aqui porque acho bem importante dizer que foi uma das primeiras manisfestações de simpatia que tivemos em Angola e me deixa muito contente até hoje saber que mesmo que hajam muitas pessoas rudes e que tratam mal os estrangeiros de Angola, há pessoa como este rapaz, o qual depois veríamos outra vez em Namibe no dia seguinte}.

Tomamos o caminho para Lucira, tratava-se de uma estreita passagem sobre uma antiga estrada de asfalto completamente cheia de buracos (causados por explosões da guerra) entre duas gigantescas muralhas de un Cãnion. O caminho era o fundo da racharura do Canion, e apesar de ser curto (uns 5km), por causa dos estragos demoramos mais de meia hora para chegar e só chegamos porque nosso carro era 4x4, senão não teríamos podido passar ali.

Eram mais de 9h da noite quando chegamos na cidade, passamos por uma avenida central, compramos pão num depósito de pão. Devia ser sábado (mas disso não lembro bem) e havia musica nalguns bares e lanchonetes da cidade. Conseguimos chegar perto da praia, estacionamos o carro e aí dormimos tão rapidamente que o colchão duro que estendíamos na parte de trás do carro sobre os bancos (abaixados) parecia o leito doce dum hotel cinco estrelas.

Somente na manhã seguinte conhecemos a cidade e vimos que ela estava rodeada e isolada entre o canion e o mar. A única maneira de chegar ali era por aquele estreiro caminho na fratura da terra ou diretamente pelo mar. A administração estava na beira da praia, aí tambem havia uma pequena praça, um trapiche rudimentar de madeira, agumas canoas e muitos peixes secando ao sol.
Chegamos de atrás daqueles morros

Bem no alto daquela pedra havia uma cruz.

4 comentários:

  1. Olá Vivi,
    Me chamo Luciana, sou brasileira e vivo em Lisboa, estou indo trabalhar em Luanda a partir de Julho e estava em busca de um ortodontista para fazer minha manutenção e achei seu blog por conta disso...
    Será que vc podia me enviar os contactos desta clínica?
    Meu email é lucianaalexandra@hotmail.com
    Você ainda vive em Angola?
    Um super beijo
    Luciana

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  2. Olá Vivi,
    Estive em Moçâmdes desde os meus 2 anos até aos 16. Depois fui para Benguela e de lá saí para Portugal aos 19, para continuar os estudos.
    Ao falar na praia da Lucira, vieram-me as lágrimas aos olhos. O meu pai era pescador no praia do César, praia contígua à Lucira, onde fiz a minha 1ª classe. Depois estive interna no Colégio das Madres, em Moçâmedes.
    Suponho que não tenha visitado a praia do César. É qualquer coisa de espectacular!... Foi aí que aprendi a amar o mar!... Que é uma das minha grandes paixões.
    Tenho pena de não ter nenhuma foto dessa praia maravilhosa. Nem tenho palavras para a descrever de tão bela que é!...
    Ao fazer a descrição da viagem até à Lucira estava a imaginar as nossas viagens de camioneta de Moçâmdes para o César!!! A minha mãe, medrosa, mandava parar a camioneta e seguia a pé uns quantos metros até passar o perigo, como ela dizia...
    Recordo esse tempo maravilhoso que passei em Angola com muita saudade e gostaria de lá voltar.
    Um beijo grande e obrigada pela partilha.
    Odete

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  3. Olá Odete, Obrigada pelo seu comentário. Pois eu também não tenho mais fotos, uma pena. Também gostaria de voltar, e quem sabe conhecer a praia do César. O lugar é realmente lindo, e acho que eu era como a sua mãe, tinha medo de certos lugares. ;)

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